Que meus filhos e netas recordem o meu amor pela escrita! Afinal as histórias são feitas para serem partilhadas. Só assim elas se propagam e se perpetuam...

sábado, 27 de outubro de 2012


pai
Partiste a 27 Outubro 2003

PAI
Não sou forte como pensavas.
Ajuda-me!
Não sou tão corajosa como querias.
Ensina-me!
Não sou grande como tu.
Espera-me!
Dá-me a tua fortaleza,
espelhada na mão que me sustentava.
A tua coragem, provada, dia a dia,
na tua luta para que eu vivesse melhor.
A tua grandeza,
presente na dedicação que existia
à espera da minha chegada,
e que existe na continuação do amor feito mensagem,
até que eu chegue ao limiar do exemplo que me destes!
E cada dia, deixa-me ser a filha forte,
a filha corajosa, a filha grande,
pelo amor com que preparo as homenagens que mereces!
Lá, onde estiveres, hoje como sempre é o teu dia.
Amar-te-ei sempre!




sexta-feira, 26 de outubro de 2012

Saudades dos docinhos.


Hoje deu-me uma saudade, dos tempos de menina, que minha mãe fazia uns docinhos maravilhosos.

Na altura não eram fácil, inicio de vida haviamos mudado para Tete há pouco, duas filhas pequenas, um emprego novo uma vida a começar.

Os docinhos, nada de especial, apenas derretia o açúcar em lume brando, enquanto caramelizava, partia amendoim em bocadinhos, quando estava a mistura no ponto juntava tudo.

 
Meu pai, que lhe fazia companhia, sentado  na cozinha ia fazendo canutilhos de papel e colocando nos gargalos das garrafas vazias de laranjada.

Apurada a mistura, era despejada nos ditos canutilhos, um a um, num cuidado imenso para ninguém se queimar, uns com e outros sem amendoim a gosto de todos.

Para acabar um palitinho era colocado a meio que iria servir para agarrarmos na doçura.

Deixava-os arrefecer, e quando rompíamos pela cozinha dentro vindas da brincadeira da rua, já fria a doçura, apenas se tirava o papel, o que nem sempre era fácil e recorríamos ao pai ou á mãe para nos ajudar.

Simples, bastava humedece-lo, e era ver-nos correr novamente para a rua chupando aquelas delicias e fazendo inveja a quem nos olhava, outras vezes sentávamo-nos os três, eu minha irmã e meu pai, nas escadas da rua saboreando aquela maravilha.

Como eram boas as “sombrinhas” de açúcar que minha mãe fazia.

A vida foi passando, e a receita repetida para meus filhos quando de ferias na aldeia em casa dos avós.

Jamais esquecerei o gosto doce do açúcar em ponto que tinham aquelas sombrinhas e da companhia do meu pai.



quinta-feira, 25 de outubro de 2012

Nós os Moçambicanos.






Nós os Moçambicanos, falamos e não nos entendem!
Não é por não ser a mesma linguagem, a portuguesa cá e lá, mas não entendida pelos de cá quando falado pelos de lá.
Nalguns casos, é bem possível que eu tenha falado português com expressões que seriam comuns lá, são desconhecidas cá, por exemplo- a maçaniqueira de Tete , que por ca ninguém conhece.
Eis uma das razões porque gosto tanto de ler escritores Moçambicanos é que eles escrevem como se fala em Moçambique, e entende-se tudo.
Então agora com o novo acordo ortográfico, entende-se melhor a maneira como se escreve por lá do que a maneira como se escreve por cá, e sem falar no modo de escrita muito usado pela juventude de hoje.
Por exemplo: eu k qd o vi tb psei o mm. (eu que quando o vi também pensei o mesmo).
Digam lá se escrevendo assim, se podemos esperar que um destes jovens consiga redigir algo perceptível e correcto no futuro.
Na minha opinião, foi coisa inventada por analfabetos para se entenderem, e infelizmente seguida por gente letrada, que poderia ter a vaidade de saber redigir uma frase ou um texto correctamente escrito.
Pois pegando num qualquer livro de um estudioso das terras de Africa, pode facilmente encontrar as diferenças dos significados das palavras.
Algumas palavras com significado diferente, mesmo sendo uma mescla do português com a língua nativa:
Afatado- com fato novo
Amanhecer- passar a noite em claro
Acidenta- ter um acidente
Bacela- excedente oferecido ao produto de compra
Baixa- terreno de cultivo junto ao rio
Balalaica -. fato completo de calça e camisa de 2 ou 4 bolsos e manga curta, conhecido em Portugal como safari
Banheira- café duplo abatanado
Bazuca- garrafa de cerveja grande
Bombar- fugir
Buiça- da cá
Kanimanbo- Obrigada Cantina- loja do mato
Cantina - loja geralmente no mato a beira das estradas.
Capim  - tipo de erva daninha
Capulana -. Pano de variadas cores, usado principalmente como saia ou para levar os bebés às costas
Chuínga - pastilha elástica
Estilar - mostrar-se, pavonear-se, gingar
Famba - vai‑te embora! ala, xô! suca (de famba, “andar, ir”, comum a várias línguas da região
Farmeiro -. dono de uma farm, agricultor comercial, por oposição a camponês, do sector familiar (talvez de origem inglesa, farme)
Flat – apartamento
Jinga- bicicleta
Geleira -. frigorífico
Inhacuaua - emissário, chefe
Inhacoso - tipo de antílope
Macaiaia - empregada que toma conta das crianças, ama
Maçaniqueira -. nome de várias árvores de frutos, nomeadamente do género Ziziphus e a Cupania racemosa Tadek (maçaniqueira de Tete)

machamba - terreno de cultivo, normalmente do sector familiar

Machimbombo, machibombo -. camioneta de carreira; autocarro

Malambe - fruto do embondeiro
Maningue - muito

Mapira - cereal da família dos sorgos
Marrabenta -tipo de dança e música do Sul de Moçambique
Matabichar -tomar o pequeno-almoço
Matope -lama
Milando - problema, confusão, briga, disputa
Muzungo -pessoa branca
nhúnguè [nhúngüè] - membro de um grupo étnico de Tete; a sua língua; relacionado com este grupo étnico ou com a sua língua
Passopa [passópa] - vai-te embora! suca (do afrikaans (neerlandês) pas op, “cuidado! atenção!”)
Quizumba (quizumba )- hiena
Sabão-mainate, sabão‑mainato-. sabão em barra
Saguate - presente de cortesia ou para comprar
Satanhoco - patife, malvado, desgraçado
Sipaio (às vezes também cipaio, grafia não justificada etimologicamente) -. soldado de uma força policial
Tchovar, txovar - empurrar
Xicuembo - feitiço
Xirico - tipo de rádio pequeno a pilhas
Xitimela - comboio
Zip- fecho de correr para roupa
E eu que continuo a julgar que estou em Africa-Tete, e por força do hábito vou aplicando alguns termos no que escrevo o que me levou a ouvir comentários de quem se dá ao trabalho de ir lendo o meu blog, que a minha maneira de escrever não é a correcta.
Não faz mal, amigos eu sou mesmo assim, e como hoje chove vou evitar o matope, e se o meu carro não pegar vai ter que ser tchovado, e se mesmo assim não der, lá vou ter que apanhar o machimbombo para o trabalho, esperando que não haja mais milandos para resolver.

quarta-feira, 24 de outubro de 2012

Politiquices em Africa

POLITIQUICES EM AFRICA



A propósito de política, hoje recordei uma cena do meu tempo de menina:

Tete, uma cidadezinha cuja temperatura media anual rondava os 35/ 40º.

O calor apenas permitiam  a saída das gentes da terra ou ao amanhecer ou ao entardecer, quando o sol baixava e amenizava os termómetros.

De quando em vez  a visita de alguém importante na politica.

Movimentavam-se todos meios para que  Suas Excelências fossem condignamente recebidas.

Á época o aeroporto ficava por detrás da cidade, no “chimadzi,” com acesso facilitado aos viajantes, quer de voos normais quer os fretados, mas pouco cuidado, apenas capinado em redor da casinha que servia de apoio a quem embarcava ou desembarcava.

Os preparativos transformavam o quotidiano de todos, numa  correria tanto das senhoras para arranjar as toiletes, para o jantar que decorria normalmente no palacio do governador, bem como os cavalheiros  que já espumavam só de pensar no sacrifício de terem que envergar o fato de casaco e gravata sob o sol abrasador.

As individualidades da terra, chamavam todos os representantes etários, desde o administrador ao regulo para que houvesse gente muita gente a receber as visitas.

Recrutava-se gentes das aldeias em redor para "capinar" os acessos e pintar as pedras e os troncos das árvores até meio, de cal branca que ladeavam as estradas até ao aeroporto, para que tudo ficasse “chibante”.

Eram os tais voluntários "obrigatórios", acompanhados pelo "sipaio" que de cofió vermelho, farda de caqui, chibata da mão,iam dando ordens para que tudo andasse mais rápido.

Chegado o dia, vinham milhares de pessoas das aldeias em redor da cidade, vinham em camiões militares, todos ao monte nas carrocerias de ferro, homem, mulheres crianças de todas as idades eram descarregados ao longo do caminho por onde passariam as personalidades.


Como eram muitos, chegavam bem cedo e sob o tal sol abrasador ali ficavam acompanhados pelos seus "inhaquaus" (chefes da aldeia), e  cantavam, batiam palmas, vibravam as línguas dentro das cavidades bocais provocando aqueles sons agudos, bem típicos de Africa.

Alguns escolhidos, rodopiavam num batuque demostrativo de suas danças, acompanhados pelo sonar dos tambores tribais.


Horas a fio, á fome e á sede, e se alguém perguntasse que estavam ali a fazer ou quem iria chegar para ali estarem sob aquele sol abrasador o dia inteiro, respondiam "mezungo unkulo".(senhor grande).


E lá chegava o enorme passaro de ferro que deixava muitos de boca aberta e até amendrontados, donde saía o tal “mezungo”, que não faziam a mínima ideia de quem poderia ser, mas recebia as honras militares, os cumprimentos pouco demorados devido ao calor, e saíam de carro, acenando aos presentes, dirigindo-se para  um local de ar condicionado no máximo, para saborear o excelente repasto preparado propositadamente para a ocasião.

O Povo, esse aos poucos  iam abalando para as suas terras em cima dos tais camiões,  mais mortos que vivos de fome, sede e cansaço, numa completa ignorância do que acabavam de presenciar, mas  para a qual a presença fora obrigatória.

E a noticia saía, " Recebido por centenas de pessoas, chegou a Tete sua Excelencia que muito agradado ficou com a recepção"....



Para terminar vejam este blog donde surrupiei estas fotos a amiga Luiza Ingá. Vale a pena para quem gosta de aviação.

terça-feira, 23 de outubro de 2012

A “msuaia” (formiga) voadora

Naquela noite chuviscava, cheirava a terra molhada mas os calores sufocantes mantinham-se.
Sentado numa cadeira de lona, na varanda que circunda toda a casa de estilo colonial, com o transístor a pilhas entre as mãos vai ouvindo as notícias da RSA.
Só assim se consegue saber a novidade que nas rádios locais não passavam.
Muda de estação e deixa que a música ligeira o acompanhe pela noite fora, discos pedidos mensagens de amor ou outras, enviadas nas entrelinhas das letras  musicais.
Na rua mesmo em frente o poste de iluminação da rua enche-se se uma imensa nuvem de insectos.
A “msuaia” (formiga) voadora, sai do chão voando por todo o lado. Correm os meninos para a apanharem, e com as suas mãozinhas pequenas e risos estridentes tentam ver qual o que mais consegue meter no saco.
Uns pegando nas asas levam-nas a boca como petisco delicioso, outros esperam para as colocarem numa chapa quente em cima do fogo, que as deixa torradinhas. Entre risos e outros ruídos desaparecem na noite.
Os mosquitos invadem a sua paz, pega na velha toalha que traz sempre ao pescoço para ensopar o suor e tenta afasta-los para longe.
Continuam no entanto a rodea-lo, acalmam-no os ruídos da noite, aqueles que só em África se ouvem e que nos embalam o descanso .
Recolhe-se, mas faz calor apesar da chuva e a casa está quente, opta por se esticar no velho burro de campanha de lona verde já surrada de tantas vezes receberem seu corpo cansado.
Um fresco lençol cobre-o, fecha os olhos e adormece, embalado ainda pela musica do velho transístor, que colocara por perto, e com um imenso sorriso de felicidade ao som da sua Africa, esse paraíso sonhado, porque cedo ira amanhecer o novo dia.

  

domingo, 21 de outubro de 2012

“Hotel TETE”



Na cidade apenas um hotel, os viajantes que passavam por Tete, tinham apenas um , que hoje chamariam de “charme”.

Aconteceu durante muitos anos, ou ficavam nele ou numa qualquer pensão das poucas que havia na cidade.

Este edifício datava de muitos anos, talvez dos primórdios da cidade, mais tarde talvez pela imponência do edifício, foi remodelado fazendo do edifício um belo hotel “HOTEL TETE” (conhecido pelo hotel Silva, apelido do proprietário), com uma escadaria imponente culminando ao cimo com duas magnificas estatuetas talvez de Deusas gregas (deslocadas do seu país), como que dando as boas vindas.



Era na verdade um edifício bonito com uma decoração ao tempo, uma bela esplanada, onde a sociedade da época se reunia bebericando os seus whisky carregados de pedras de gelo,  soda ou gingerale, ao gosto de cada um, servido por criados de branco vestidos e bandejas cromadas.

Uma bela vista sobre o rio Zambeze, completava a beleza do cair da tarde.

Um local aprazível onde corriam as mais diversas historias de caçadores que ali se hospedavam temporariamente ou assunto de grande ou pequena importância da politica local. 


Um edifício que guardava a imponência duma sociedade prospera da época.

Mais tarde a piscina veio acrescentar a beleza e comodidade ao hotel, uma mais valia, e passou a ser frequentada pelas senhoras de fatos de banho á época que lhes cingia o corpo numa elegância nunca por ali vista.

Certo dia a chegada de uma “madame” de roupão cingido a um tão belo corpo, chama a atenção de todos, mais ainda porque vinha acompanhada de um seu criado, vestido de libré branco alvo.

Dirige-se á beira da piscina, abre o roupão e deixa vagarosamente deslizar pelos ombros torneados, recolhe-o, entrega-o ao criado.

Um "estiloso" mergulho e banha-se calmamente refrescando-se do calor que se fazia sentir naquele fim de tarde quente.

Em pé junto a piscina manteve-se o criado aguardando “petrificado” e de roupão da senhora, na mão.

Após algum tempo a "sereia", sai da água, veste o roupão e retira-se, acompanhada de seu serviçal que a seguindo, guarda alguma distância.

Valeu morar ali perto, o que permitia esta entrada e saída teatral sempre que lhe apetecia.

Deixava para trás todos os presentes, em conversas sobre a dama que acabara de sair.

Momento destes e outros de glória vivido durante vários anos, fez a história deste imóvel até que a cidade crescera e outro hotel foi construído.

A novidade de novo “poiso” deixa para traz os dias bons do velho hotel, que muitos ainda se lembrarão.

Tempos depois com tristeza vi-o transformar-se no comando militar “ZON” de Tete, um entrar e sair de militares durante anos, mas o edifício manteve-se belo, não se deixava abater pelo infortúnio da decadência que os anos lhe traziam.

Acabou a guerra, foi abandonado, começando a cair numa morte lenta de velhice e apesar das deusas que encimavam as escadarias se manterem no seu pedestal, caiu.

Soube há tempos que foi totalmente destruído para dar lugar a um centro comercial.

Jamais se ouvirá a musica que tocava nos bailes, os risos dos hóspedes que o frequentavam, as vistas da esplanada e as tardes de verão na piscina.