Que meus filhos e netas recordem o meu amor pela escrita! Afinal as histórias são feitas para serem partilhadas. Só assim elas se propagam e se perpetuam...

sábado, 25 de janeiro de 2014

EMIGRANTE

imagem da internet

Em Portugal, a miséria em que vivia grande parte das gentes num interior esquecido onde o povo nem  sabia  escrever o nome mas muito sabedor de todas as manhas da terra que labutava de sol a sol, desesperava olhando para os filhos que pediam pão e nada tinha que lhes dar.

A pobreza era extrema, já não eram chamado para as jornas, do bocado de terra que tinha seu apenas tirava as batatas e as couves que mais não davam para fazer uma sopa e matar a fome.

Mirravam as esperanças, valia-lhes a generosidade dos que também tendo pouco partilhavam com quem tinha ainda menos, e lhe dava um alqueire de farinha, para fazer o pão no velho forno da aldeia.

Não rara era a vez que de olhos esbugalhados as crianças esfaimadas olhavam para um naco de broa que outros traziam no saco da escola.

Os invernos chegavam, o desespero e a família obrigavam a pedir ajuda para emigrar.

Recorriam a outros que já emigrados por terras de Africa os convidavam a aventurarem-se num desconhecido.

E aventuravam-se por esse mundo fora, atravessando os mares durante dias intermináveis, uma trouxa com uma muda de roupa, na algibeira pouco dinheiro que lhe for emprestado, no coração tão grande a saudade como a esperança num melhor futuro.

Trinta e tal dias de mar que o balançar do barco quase o matam. Revolta-se-lhe o estomago o cheiro nauseabundo do catre onde dorme mais uns quantos homens deixa-o doente.

Júlio e Luís travam-se de conhecimento, um viera dos lados da Guarda outro mais lá para cima da zona minhota.

 Nenhum sabe ao que vai, apenas embarcaram numa aventura combinada com alguém que prometera ajuda-los.

As conversas giram sobre o que diziam da fartura daquelas terras que produzem, duas vezes ao ano, seriam um constante no semear e colher. A esperança anima-os.

Por fim avistam terra, conforme se aproximam o calor é sufocante, mas a paisagem luxuriante.
Á chegadas separam-se, despedem-se e cada um segue seu destino.

Espera-os quem os transporta, Júlio segue para a cidade do interior, Luís ainda fica no cais quando Júlio já se faz ao caminho.

Viaja com um desconhecido incumbido de o esperar, e passa mais um dia de carro sobre um calor intenso e a fome apertar.

Vai ouvindo histórias de animais ferozes, das gentes locais etc.

Pelo caminho apenas terras de perder de vista, secas por cultivar, gentes seminuas, eles de calções e tronco nu elas de capulana cobrindo “as vergonhas” mas de peito ao léu, crianças brincando ou chorando nas costas das mães.

Vai ficando assutado com o que vê instalando-se a dúvida se seria a melhor coisa que fizera deixar a miséria por aquilo que ia vendo, até que o cansaço toma conta dele e adormece entre o barulho do carro e os solavancos da estrada.

Ao anoitecer chegam a Tete, Manuel recebe-o com um ar de quem está feliz por aquelas terras, leva-o para uma onde mora, bem modesta, mas depois da refeição quente e dum banho macua, sente-se melhor.

Enquanto isso vão conversando, e explica que iriam para o Zobué, no dia seguinte onde ele ficaria a tomar conta de uma cantina.

Já quase não ouve o que lhe dizia Manuel cabeceia sobre a mesa até que o manda deitar-se.
Pela manha tomam o matabicho e saem para carregar a carrinha de bens que irão fazer falta, e partem para o destino.

Horas depois chegam ao local, para Júlio um lugar que o assusta, apenas negros o rodeiam, uma casa pequena com uma loja longe de tudo, perdida no interior desconhecido, entregue apenas á sua sorte.

Pensa mais uma vez da mulher que deixara na Metrópole e chora.

Sente-se num beco sem saída.

Nesse dia Manuel fica com ele para lhe ensinar como gerir tudo aquilo, e á noite sente medo do escuro e dos sons da noite, dentro de casa apenas a ténue luz do petromax, mas é assim que terá que se habituar.

O trabalho não é duro como aquele a que vinha habituado, mas ainda se não habituou a ideia de como iria viver naquele fim do mundo.

Aos poucos vai-se habituando, aprende as artes de como lidar com as gentes que o rodeiam, á comida que o rapaz que toma conta de casa faz, e aos dias infindos que vão passando.

Já pensa em mandar vir a mulher, mas primeiro terá que pagar a divida de quem lhe emprestou o dinheiro para a passagem do barco, e deixa o tempo passar.

Apenas via um branco quando algum carro passava, e sabendo que havia gente nova na no local paravam para cumprimentar, iam dando conselhos de como se proteger do ambiente pois como diziam os negros, ele parecia batata nova com a pele tão branca, o que já lhe valera umas queimaduras.

E o tempo ia passando!











domingo, 19 de janeiro de 2014

O homem de D.Emilia

imagem da internet

O homem de D.Emilia, de estatura baixa e forte com uma barriguinha proeminente vestia cabedulas de caqui e camisa branca quase sempre apertada apenas com um botão pois o clima assim o obrigava.

Na cabeça um velho capacete que lhe dera um amigo quando da sua chegada a África dizendo que por ser forrado a cortiça era mais fresco para os dias que iria enfrentar futuramente.

Nos pés uns sapatos leves que noutros tempos havia sido de uma cor definida e da qual já pouco se via mas que não tirava dos pés com a desculpa que esses não lhe davam cabo dos calos. As meias, essas chegavam aos joelhos sempre o protegiam da micaias e outros capins que lhe roçavam as pernas quando caminhava pelos matos.

Afastado da casa havia plantado um pomar de laranjas e maças, um campo de legumes e outras leguminosas que consumia em casa e vendia na loja.

Os molhos de couve atados com uma “cambala” bem como o feijão seco tinha saída pois era a base da alimentação das gentes locais.

Fosse por que razão fosse, era um motivo válido para sair pela manhã acompanhado dum trabalhador de casa e caminhar uns bons quilómetros por carreiros de terra batida, até á machamba.

Por ali se entretinha até a hora do almoço, quando o calor apertava e a hora do almoço chegava.

Á quarta-feira não o fazia, ficava a espreita quando qualquer ruído que lhe parecesse ser de carro o fazia sair até a varanda perscrutando o horizonte na esperança de ver chegar a carreira.

Vinha de Tete, conduzida pelo velho Matos, trazia gente levava carga e mais importante era portador do correio, dos jornais e das novidades da cidade.

Uma paragem pequena porque o caminho era longo, mas havia sempre uma refeição ou um bom petisco a sua espera.

Em frente a loja havia uma enorme mangueira onde se amontoavam as gentes com seus “catundos”, cabritos e cangarras de galinhas que o ajudante arrumava no tejadilho e o transportava para um qualquer destino.

Um dia sentiu-se mal, fosse da algo que comeu fosse do que fosse não se levantou pela manha. D.Emilia parca em recurso médicos, agarrou-se aos chás curativos que sempre funcionaram, mas desta vez tal não acontecia.

Na manha seguinte pediu ao Jose que trabalhava há muito lá em casa que pegasse na ginga e fosse em busca de ajuda ao posto medico.

Era o pior que poderia acontecer a quem vivia nas cantinas por aqueles matos, numa emergência pedia-se a ajuda algum cantineiro próximo e a espera nem sempre corria bem.

E assim aconteceu, foi tarde e inesperadamente D.Emilia fica viúva.

Apesar do desgosto, manteve-se à frente da vida, gerindo a cantina e a vida como antes havia acontecido.

Regressar estava fora de questão, ainda trazia na memória as dificuldades da vida que deixara em Portugal.

Passou a ser a conhecida como a cantina da viúva, e a vida continuou mais solitária ainda, e contando sempre com a amizade das gentes das cantinas vizinhas e o respeito das gentes locais.