Que meus filhos e netas recordem o meu amor pela escrita! Afinal as histórias são feitas para serem partilhadas. Só assim elas se propagam e se perpetuam...

terça-feira, 2 de outubro de 2012

ALMOÇO TETENSES 05OUTUBRO






Há tempos pediram-me que contasse histórias de vida das tantas que tivemos nas terras longínquas de nossa África.
Peguei num caneta disposta a partilhar uma das muitas que guardo no meu baú de recordações e num repente fervilham na mente as inúmeras histórias que teria para contar o que me dificulta a escolha.
Faltam-me as palavras, “aquelas maningues fortes que fazem mesmo transmitir aquele sentimento de verdade, verdadeiro.” (escrita á maneira moçambicana).
Recostei-me no sofá, coloquei junto a mesinha de centro a velha caixa de lata outrora cheia de doçuras e que hoje guarda religiosamente as fotos antigas, algumas já amarelecidas do tempo, fotos de família, amigos e paisagens do Moçambique, minha terra.
Pego nelas com todo o carinho e cuidado para as não estragar, pela milésima vez fixei o olhar e fui recordando rosto a rosto as pessoas que vejo.
Sinto que se me toldava a visão, talvez fosse uma lágrima teimosa, ou talvez não porque continuava com um sorriso estampado no rosto.
Passaram as horas, a meu lado, esquecida, a caneta de tinta permanente, escondida por tantas fotos espalhadas em redor.
Acabo o chá de sabor forte e gostoso, proveniente das grandes planícies do Gurué e que já esfriou na chávena, e, enquanto decidia se  vou ou não  escrever.
A história que tinha para contar é linda, de gente amiga, feliz, num país de sonho com muito sol, comida picante e boa, frutas exóticas, maçãs pequeníssimas muito doces que chamávamos” maçanicas”, árvores frondosas que dão malambe, um por de sol sem igual, noites quentes de luar, o som longínquo dos batuques, o uivo das hienas, o ronco do leão.
Mulheres de capulanas de cor berrante, com os filhos as costas e um lenço na cabeça, pela mão o mufana de cabedulas, ou sentados na esteira, o monhé de longas barbas a porta da loja olhando o alfaiate que costura na varanda, e aquele que passa de ginga de óculos escuros e rádio no “som”.
Brancos de balalaica e calção com meias altas até aos joelhos, sentados na explana do café Zambeze de copo de whisky na mão, sorriso estampado em amena cavaqueira, senhoras que passam com vestidos de chita, andando apressadas fugindo do calor.
Sobretudo a união de todos e a amizade, coisas belas, fantásticas!
Por incrível que pareça passaram quase 40 anos, e as lembranças continuam vivas, repetem-se as memórias de tantos anos, as mesmas gentes sentados num restaurante de nome Zambeze, com vista para um rio que não do mesmo nome mas sim o rio o Tejo.
É já sexta-feira 05 de Outubro 2012, cento e tal pessoas vão estar presentes, vão ser abraços e beijos de tanta saudade, mas estamos todos numa forte união que vão passando às gerações.
A minha caixa de fotografias e memórias vai aumentando, e eu, sinto que estou em Moçambique junto da minha gente onde fui tão feliz.
Voltarei para contar como foi, almoçar com amigos a beira do Zambeze a milhares de quilómetros de distância, com as minhas gentes, o mesmo cenário mais que não seja imaginário.



Descobri esta manhã...


Descobri esta manhã!
Levantei-me há hora do costume, já atrasada ia arrastando as chinelas, ensonada e passei pelo velho espelho de linda moldura barroca pendurado há anos no corredor.
Dei um passo, dois passos… e voltei atrás! Olhei a imagem reflectida, encolhi os ombros segui caminho.
Banhei-me e coloquei um vestido garrido, perfumei de alfazema, meu corpo, eis que quando me preparo para tratar meu rosto reparo, que algo diferente se passava.
Procuro os óculos que a vista já enfraqueceu e torno a olhar a imagem reflectida.
Meu Deus, como não havia dado conta das pregas miudinhas que se formaram em redor de meus olhos. No silencio do tempo elas foram-se acomodando aqui e ali sem que desse conta delas, como que chamando-me atenção dos anos que passavam.
Nem disso havia dado conta, mas olhei como desafiando-as da razão de nem terem pedido licença para se instalarem.
Elas continuaram exactamente no mesmo sitio e persistentemente avisando que continuariam a proliferar calmamente por todo o lado.
Sorri, passei sobre elas a ponta dos dedos enquanto pela minha mente se desenrolava toda uma vida passada de muitas alegrias, dos amores vividos dos filhos amados dos netos crescidos e desafiando todos os sentimentos contraditórios próprios do ser humano, desejei-lhes as boas vindas!
Continuarei a trata-las com o melhor dos cremes na tentativa de as retardar, numa luta diária como que desafiando quem ganhará a corrida do tempo, se elas se eu, mas de sorriso nos lábios pois será com elas que dividirei os beijos e as carícias dos que mais amo.
Ganhei companhia para o resto da vida!