Que meus filhos e netas recordem o meu amor pela escrita! Afinal as histórias são feitas para serem partilhadas. Só assim elas se propagam e se perpetuam...

domingo, 31 de dezembro de 2017

A VAIDADE DE FIM DE ANO

                                                       Foto da internet. Luisa Hingá



Foi há muito tempo, o telefone não parava, e a costureira que ainda não me tinha o vestido para o baile de fim de ano pronto. E o lugar da cabeleireira marcada a hora há já uma semana, estava em cima dela.

A Cabeleireira D. Maria José Simas morava na mesma rua da costureira D. Lurdes Ramalho, saio a correr à boleia do meu pai e peço para parar por minutos em frente a casa dela.

Subo as escadas duas a duas quase deitando os bofes pela boca, ao que ela logo que me vê diz estar um bocadinho atrasado.

O vestido era cor de rosa em chiffon, sem ombros mas preso a volta do pescoço simplesmente, mas a frente toda ela era bordada a mão com pedraria e missanga.

Olhei para ele entre mãos que seguravam a agulha rápida no enfiar das pedrinhas e borda-lo.

Achei lindíssimo, só pedi que o tivesse pronto quando voltasse da cabeleireira.

Impaciente já ouvia a buzina do Volvo que meu pai tinha, pela demora que ocorria.

Desço as escadas a correr com a possibilidade de me espalhar e já não poder ir ao baile.

Enquanto me leva a arranjar o cabelo, vou perguntando se havia reservado mesa para o réveillon.

Entro no salão e estava cheio, todas as senhoras se haviam lembrado de arranjar o cabelo tarde, desanimei ao mesmo tempo que ia pensando que poderia fazer dele pois era comprido roçando o meio das costas e eu não tinha mãos para fazer nada dele.

Já sol baixava quando chega a minha vez, mais um pouco e sairia de lá com um artístico penteado de fazer inveja a qualquer uma (isto nas miúdas era corrente).

Depois de pronta saio apressada apanhar o meu vestido, lindo de morrer, e levo-o para casa.

Quase não jantei, entrei vezes sem conta no meu quarto onde estendido cuidadosamente brilhava a minha joia da coroa.

Caramba não mais chegava a hora de sairmos de casa.

Peguei no pó de arroz, no blush nas sombras etc e comecei por ai, com todo o cuidado ia fazendo a maquilhagem, que tinha medo borratar com o calor que fazia.

Lá fora estendido ao fresco numa cadeira de lona meu pai parecia nada ter a ver com nada.

Chamei-o, disse-me que ainda era cedo. Não, jamais vestiria o meu vestido com a antecedência de sair de casa não fosse ele amarrotar-se.

E o relógio que resolvera também andar mais devagar, nunca mais eram as tais horas de sairmos.

Até que senti que ele se levantara calmamente para também se aperaltar, afinal havia um ano a sair do calendário e outro a entrar.

Saímos de casa, todos arranjados e perfumados, em direcção ao aero-clube.
Sinceramente quase me não sentei no carro, fazia força com os braços no assento da frente para não me sentar e não amarrotar o vestido.

Ufa! Como era longe de minha casa, além de que ao chegar o estacionamento de carros estava cheio, o que mais demorou, encontrar lugar para estacionar.

Quando por fim subi as escadarias principais, de vestido que brilhava como a lua, saltos altos e brincos compridos terminarem numa pérola, pensei estar num céu só meu.

Já a musica do conjunto tocava e a sala cheia de dançarinos, desiludiu-me pois pensei haver mais olhares para a minha beleza.

E dancei, dancei a noite toda deixando de me importar até com a transpiração que ia marcando o vestido.

Meia noite e o adeus ao ano velho com a chegada do ano novo era uma euforia sem igual.

Taça de champanhe na mão de braço levantado, e corria-se as mesas brindando com todos.

A música continuava, já o sol queria romper as trevas para dar lugar ao novo dia quando aos poucos iam saindo, ficando apenas aqueles que abraçados olhavam a bola vermelha que indicava o novo dia vir a ser bastante quente.

Era assim um dos fins de ano na terra onde nasci, e que me deixam muitas saudades.