Que meus filhos e netas recordem o meu amor pela escrita! Afinal as histórias são feitas para serem partilhadas. Só assim elas se propagam e se perpetuam...

quarta-feira, 12 de agosto de 2015

A cadeira verde de Lona



Faz um calor infernal, as temperaturas fazem lembrar as de outros tempos em outras terras.

Sentada numa rede no meu quintal vou apanhando o pouco fresco que a noite vai trazendo enquanto o sol se retira no universo.

Ao longe a grande bola de fogo desce vagarosamente despedindo-se do dia entre um céu de nuvens escassas que sempre o acompanham à mesma hora.

Fecho os olhos e recordo:

Numa cadeira de lona verde, na varanda colonial que circunda a casa, descansa, vestido com umas “cabedulas” de caqui e uma camisola interior de algodão perfurada e ao pescoço uma toalha pequena que lhe ensopa o suor, e de quando em vez afasta as moscas ou mosquitos quando a noite cai.

O silêncio apenas quebrado pela música do velho transístor a pilhas deixa-o sonolentos, pelo jardim apenas os grilos ou o rastejar de algum bicho se ouve.

Reina a paz, aquela paz exterior igual a paz interior que sentimos.

E as horas vão passando o sono já convida a regressar ao quarto mas estava tão bem ao fresco.

E passam as horas, e dormita-se na cadeira chegando mesmo a pegar no sono pesado que descansa o corpo e renova a alma.

Pela madrugada refresca, aquele ar fresco da cacimba das noites já arrefece o corpo, ou se retira para dentro de casa para acabar o descanso, ou como muitas vezes, deixa-se estar naquele torpor do sono bom, então puxa a camisa que estava pendurada na cadeira e cobre o peito, aconchegando-se um pouco até madrugada.

Bem cedo ao lado de casa já o movimento se adensa com as mulheres que passam pelo carreiro de terra feito à força de tantas vezes por ele caminhar, de latas à cabeça em direcção ao rio.

É a criança que chora, elas que conversam alto e as aves que já cacarejam na capoeira.

É dia, abre os olhos que abarcam todo infinito, um olhar prazeroso num começo da manhã..

Lentamente levanta-se da cadeira em direcção ao duche pois da cozinha já vem o cheiro de comida.

Na mesa da sala já posta, o pão fresco e café acabadinho de ser coado.

Pouco depois já sentado, de brilhantina no cabelo e vestindo uma fresca balalaica, eis que chega da cozinha o "matabicho", num prato pejado de batatas fritas ladeado por um bife carregando um ovo estrelado.

Lentamente toma o pequeno-almoço, findo o qual sai para trabalhar.

No Jeep descapotável, sente o fresco da manha no rosto e vai indo para o inicio de mais um dia de labuta, mas antes passa no café onde já outros o esperam para a conversa matinal.

Descansado, feliz enfrenta o dia que se tornará quente mas à hora do almoço no ar condicionado de qualquer " boteco" ameniza o calor enquanto almoça ou vai a casa onde cumpre a sesta na penumbra das janelas cerradas que não deixa o fresco escapar.

A tarde que passa rápida entre uma cerveja e outra até ao cair do dia.

E é nas esplanadas de mesas cheias de garrafas de cervejas vazias e pratos de petisco que se esparramam com os amigos em conversas de fim de dia onde as gargalhas os acompanham

E regressa a casa para o jantar, toma o seu duche, veste as "cabedulas" de caqui e é a cadeira verde de lona que desde sempre o espera para terminar a noite.

Já pensara um dia desses arranjar um burro de campanha sempre ficava mais cómodo mas até lá, fica-se pela cadeira de lona que já tem seu o corpo marcado.

Como eram felizes na terra onde as horas são maiores que os dias.