Que meus filhos e netas recordem o meu amor pela escrita! Afinal as histórias são feitas para serem partilhadas. Só assim elas se propagam e se perpetuam...

segunda-feira, 8 de agosto de 2016

HISTORIAS DE FAMILIA

                                                                 (imagem da internet)

Fui à aldeia, é bom ir passear à aldeia onde a historia dos nossos antepassados paira no ar, e em cada pedra da aldeia que os viu nascer.


Olhar os campos onde outrora brotava da terra os milhos, o centeio e as hortaliças, o gado pastava e os pinhais “choravam” a resina para pequenas bicas de barro que se transformariam em economias de muita gente, e a vida existia .

Eram aldeias simples de casas de pedra ruas sem alcatrão onde se ouviam os gritos das mulheres chamando alguém que bulia nos campos, as crianças que brincavam no largo e o chiar das rodas das carroças carregadas de fenos ou qualquer outro produto do campo.

Via-se gente movimentando-se os mais idosos sentados à soleira da porta fazendo meia ou remendando alguma roupa.

Hoje os campos estão de “poiso” não há braços que os trabalhem, a gente nova partiu para a “estranja” os mais velhos para o céu.

Mas acho que todos ainda tem um primo ou familiar de porta aberta que nos receba, e é sempre uma alegria.

Perde-se a conta às horas que passam a recordar tempos antigos historias maravilhosas vivências de outros tempos que o tempo jamais apagará.

Minha mãe com um sobrinho relembrando passagens da vida, hábitos de outrora entre um esgar de saudade e um riso, inclusive os palavrões que os velhos já podres de cansaço largavam num grito de revolta mas que os fazia sentir bem aquela descarga de adrenalina e cansaço.

Era uma vida de muito trabalho e pouco descanso. Diariamente por volta das cinco da manha já os regatos de agua corriam para regar os milhos, fosse verão ou inverno era por essa hora que se começava o dia, e terminava quando já o sol se pusera há longas horas.

Uma imensidão de trabalhos que teria que ser feitos diariamente para sustento da família raramente com menos de cinco ou seis filhos.

No rolar da conversa da qual eu nem fazia parte, pois fluía baseada numa época que eu nem existia mas com muito gosto ia ouvindo.

Eis que oiço o relatar de uma passagem de uma das minhas bisavós que achei de inicio caricata mas com um fim maravilhoso.

D. Amélia senhora abastada no tempo vivia numa casa de pedra com um largo onde recolhiam as lavouras bem como o produto delas, acompanhada de uma criada.

Tinha cinco filhos que já haviam ido às “sortes”* alguns já mesmo casados quando quis o destino que ficasse viúva.

Decidiu então fazer as partilhas dos bens em vida pelo que sozinha rabiscou num papel todas as terras que possuía e dentro daquela que era a sua justiça repartiu por todos os filhos igualmente, deixando uma única que tinha junto à casa.

A condição básica é que todos aceitassem e não poderia haver trocas, pois ela lá tinha as suas razões.

Das terras repartidas por cada um dos filhos, enquanto fosse viva teriam que anualmente
entregarem-lhe determinada medida de milho, centeio, azeite, batatas, lenha para o inverno, etc que lhe daria para todo o ano.

Do terreno junto a casa , seriam cultivados pelos filhos todos os mimos da casa tais como hortaliças, feijão verde, alface, tomate que apanharia a seu belo prazer quando precisasse todo o resto seria para beneficio de todos.

Ao chegar a este momento da historia confesso que um diabinho me soprou ao ouvido, para que raio queria a velha senhora estas mordomias pois era só mais a criada sobraria certamente o que iria receber.

Continuei a ouvir o relato da historia que desconhecia de todo.

Ao domingo a mesa era posta em casa de D.Amélia e ao almoço todos os filhos lhe faziam companhia , e a conversa fluía entre todos falando sobre a vida as culturas e a família.

Entendi depois a ideia da idosa, assim conseguia manter a união familiar e quanto a partilhas jamais haveria confusão.

No entanto fiquei a magicar sobre o excedente que certamente teria ao receber anualmente o determinado de cada filho.

Eis que para surpresa minha, oiço dizer que tendo sido questionada ela responde que o excedente seria distribuído aos mais necessitados que muitas vezes lhe passam a porta sem uma côdea de pão para comerem e dar aos filhos.

Orgulhei-me desta minha bisavó que soube manter a família unida, e aos mesmo tempo fazer caridade que naquele tempo era bem necessária.


*sortes- serviço militar