Que meus filhos e netas recordem o meu amor pela escrita! Afinal as histórias são feitas para serem partilhadas. Só assim elas se propagam e se perpetuam...

sábado, 3 de novembro de 2012

Viajando por Moçambique- Part.1



Visitava Moçambique, estava na cidade da Beira havia já uns dias, e via tanta coisa diferente...o grande hotel que já não era, o Chiveve que ainda o era, o mesmo cheiro nauseabundo, restaurantes dos chinas onde comíamos aqueles camarões, enormes grelhados ali mesmo e que acompanhava com o "achar de limão" e a coca-cola ou cervejinha bem gelada, já poucos ou nenhuns restavam.

O Farol de cores desbotado continuava teimosamente marcando a sua presença, e na praia a velha carcaça de um barco que por ali decidira acabar seus dias.

Abarquei toda aquela paisagem, em mais uma despedida e uma lágrima caiu, ficavam as lindas recordações dos momentos passados naquelas areias, nem digo com quem!

No dia seguinte, despedimo-nos do amigo que nos havia recebido em sua casa de braços abertos bem á maneira moçambicana, alugamos um jipe, e partimos a aventura por aquelas estradas tantas vezes calcorreadas, no antigamente.

O medo de nos aventurarmos sozinhos não existia, estávamos na nossa terra e algo nos dizia que ninguém nos faria mal.

Carregamos as malas um “gericam” com gasolina, agua, coca colas e algo para comermos não fosse a fome chegar e as velhas cantinas ou restaurantes junto a estrada, dali para a frente, já não existirem.

Saímos da cidade, a estrada estava boa, conduzíamos devagar como que querendo registar na nossa mente tudo que a vista abarcava, a paisagem africana, os carros que connosco cruzavam, quase rojando o chão, carregando toda a família, os "machimbombos" de capacidade completamente esgotada, que continuavam a transportar no tejadilho os cestos cheios de bens alimentares, cangarras de galinhas e até um cabrito se empoleirava sobre as patas amarradas.

Algumas horas de pois, havíamos  esquecido que alguma vez havíamos saído de África, afinal os caminhos passavam todos nos mesmos locais de antes.

O sol ia subindo no horizonte e o bendito calor ia aquecendo como já  não lembrávamos de o sentir e pó invadira as nossas gargantas.

A primeira paragem numa sombra a beira da estrada, saltamos do jipe para esticar as pernas, nem viva alma se via, apenas molhos de lenha atados com “cambala”, para venda certamente.

Agua, foi o que matou a sede enquanto com a concha da mão borrifávamos o rosto para refrescar.

Á velha maneira antiga alguém molhou o lenço com água e colocou por debaixo do chapéu de caqui que trazia. Sempre refrescava durante mais tempo.

Num repente recordei o gesto tantas vezes feito por meu pai mas utilizando o capacete colonial, que sendo forrado a cortiça deixava que a cabeça se mantivesse sempre fresca.

Continuamos estrada fora, mais adiante, á beira da estrada mulheres sentadas na sombra antiga do cajueiro tentavam fazer alguns meticais vendendo caju ou carvão.

Certamente os molhos de lenha deixados lá atrás seriam delas.

No regaço o filho sugava avidamente seus peitos enquanto com a ponta do lenço que tapava a carapinha, afastava dele as moscas que teimavam  aborrece-lo.

Dois pequenitos de cabedulas rotas brincavam correndo atrás de um aro de ginga equilibrando-o com mestria que caracteriza estes pequenos.

Seguimos viagem, o destino era Gorongosa, não poderíamos deixar esta terra sem tornar a ver todos aqueles animais selvagens no seu habitat natural.
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Apanhamos a EN6 até ao cruzamento de Inchope, depois a EN1 rumo a Caia onde num repente travão a fundo, e um desvio que dizia Parque Nacional da Gorongosa.

O acesso, uma picada de terra batida, com buracos e árvores caídas na estrada que nos obrigada a uma autentica gincana, mas faz parte da aventura de visitar a Gorongosa.

Até avistarmos o portão, valeu o encontro com macacos, irrequietos que estranharam a nossa presença.

A viagem é magnífica!

O Parque é mesmo muito bonito apesar de longe do aspecto de antigamente.
Começamos logo por pagar a entrada no parque, 250 meticais e o carro, mas tinha que ser impunha-se a visita a este local.



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 Procuramos acampamento de Chitengo já antes recomendado, tem 9 bungalows em formato de cabanas todas têm ar condicionado, rede mosquiteira e casa de banho privada. Os preços variam, por exemplo uma cabana para uma pessoa só custa 3000 meticais.
Há opções mais baratas, mas a pressa dum banho, macua que fosse e uma cama para descansar, levou-nos a aceitar a  primeira.
No dia seguinte a aventura no parque esperava-nos, pois entretanto já havíamos combinado a saída com um “guia” para não andarmos as voltas a gastar combustível pois as bombas mais próximas ficavam no Caia ou Vila Pery.

Os mosquitos invadem-nos os quartos, não há repelente nem mosquiteiro que os pare, mas acabamos por adormecer embalados nos sons nocturnos do mato e da noite africana.

Madrugada, algo batia na janela do quarto, estremunhada e assustada, acordei, havia mesmo esquecido onde estava tal era o cansaço que tomou conta de meu corpo:

-Mezungo, acorda…

Olho de lado para relógio de pulso, acendo a lanterna focando o mostrador que me pareceu de números tão miudinhos que os não conseguia ver…05h00 da manha, afinal já o sol despontara há muito, havia esquecido que por ali o dia começa ao raiar bem cedo.

Preguiçosamente levanto-me, afinal a vida africana é mesmo assim, higiene feita T-shirt mudada e saio do bungalow.

Um som ruidoso dos macacos cão, que por ali aparecem todas as manhãs levou-me a recordar uma viagem que fizera de Tete á Rodésia que tivemos que parar o carro para suas excelências atravessarem a estrada num enorme bando com um ar ameaçador como que marcando o território que nós intrusos ocupávamos.

Sorri pela surpresa de os ver na mesma pose de anos atrás, e com toda a calma sem medos.

Mais adiante umas famílias de javalis e outras bichezas que se haviam habituado a passar por ali para se alimentarem do que não encontram nos matos e chafurdando nas relvas frescas do jardim  degustando as mangas doces já caídas no chão de maduras.

Vamos ao mata-bicho que tinhamos de sair cedo para fugir ao calor e ver as imensas filas de animais a procura da água que os aguentaria todo o dia.

Oh…como havia esquecido também de como era essa refeição por aquelas terras….

Um suculento bife com batatas fritas e um ovo a cavalo, sumo de fruta acabadas de apanhar e ala que se faz tarde.

Subimos para o jeep, outro que não o nosso, que haviam arranjado mais apropriado para a visita, sem capota apenas os ferros onde nos agarrávamos e sentadas nos bancos de madeira.

Pendurado há frente dois sacos de lona com água. (O coller de Africa).

Conduzido por que conhecia aqueles caminhos por entre picadas e “mecurros” atirava-nos uns contra os outros, deixando os estômagos às voltas, enquanto se ouvia o chilrear dos pássaros (mais de 500 espécies de pássaros), as rolas, a correria das galinhas do mato que em bando de escondiam

Já desanimados, eis que avistamos a primeira gazela, e mais outras com seu ar altaneiro orelhas em pé procurando proteger-se de algum perigo, e muitas espécies de antílopes, com frequentes observações de  pala-palas, impalas, oribis, inhacocos com ninhadas de crias atrás, leões, elefantes, búfalos changos, cudos, inhalas, e ainda que raramente zebras, gondongas e elandes .

LEOPARDS SITE

O lago Urema e as suas águas calmas, escondem os crocodilos e mostram os hipopótamos como os que apreciávamos no Zambeze descaradamente de cabeça de fora.

Umas  horas de autentica beleza natural e regressamos ao acampamento.

Desabituados destas andanças, e mais partidos que no dia anterior valeu-nos um bom banho e o descansar nas cadeiras de lona da esplanada do acampamento, saboreando um whisky com gelo e ver o maravilhoso pôr-do-sol da nossa África ao som dos batuques lá longe.

Noite fora vi ao longe uma fogueira que iluminava aquele pedaço de escuro da noite, levantei-me e caminhei até lá, um grupo de pessoas sentados á volta dela, conversando e rindo á sua maneira.

Parei, fechei os olhos recordei outra ocasião que em outras paragens havíamos saído para caçar, após muito tempo de caminhada, acendêramos uma fogueira, esperávamos que a agua fervesse para fazer café, estendíamos a mãos para receber o calor que emanava pois já a cacimba caía, o silencio era total apenas quebrado pelos uivos que acusavam os olhos brilhantes de algum pequeno animal que por curiosidade chegavam ate nós.

Um aconchegar que sentíamos naquele momento em que as palavras caladas diziam mais que as faladas. Era a magia da noite africana.

Sorri com esta doce lembrança, dei a volta e regressei ao bungalow.

Apetecia ficar mais uns dias mas a viagem teria que continuar, os dias estavam contados para regressar a Portugal.

No dia seguinte partiríamos noutra direcção, para trás ficava a recordação de mais uma página da nossa vida.


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