Que meus filhos e netas recordem o meu amor pela escrita! Afinal as histórias são feitas para serem partilhadas. Só assim elas se propagam e se perpetuam...

terça-feira, 30 de outubro de 2012

Quem seria o autor?



Tenho  estado a pensar quem teria sido o autor deste texto que abaixo vou colocar, e que encontrei guardado no meu computador, numa pasta que ja havia esquecido.
Vou coloca-lo pelo interesse historico de vidas da nossa cidade.
Li e revi-me naquele tempo.
Se alguem souber que foi p.f. identifique o autor.
Eu pessoalmente penso ser do Rui Figueiredo, estarei enganada?
.....
A minha mãe naquele dia estava  contrariada porque não queria de maneira nenhuma que fosse ele a ir fazer a distribuição do correio por aquele distrito de Tete fora ainda por cima dia 24 de dezembro. Mas ele tinha tanta vontade de ir voar e calhava bem, não tinha feito horas que chegassem naquele mês.
Passou, como fazia sempre, "a fazer razia" às casas, com o "Auster" e abanou as asas, como fazem todos os pilotos logo que querem assinalar aos que estão a terra, que são eles que estão a bordo, deu uma grande volta bastante apertada prá esquerda e vimos como era hábito, a carlinga verde escura que o Piper Cub tinha por cima.
A missão do meu pai naquele dia era sobretudo de ir reparar um emissor no posto do Revuwe, e claro como era costume, levou os sacos do correio.
O meu dia passou-se como todos os outros, em casa do João de Oliveira, onde passava a maior parte do tempo livre, provavelmente a jogar ao berlinde ou ao "Jota" com o Nelito, ou o Jacinto.
Morávamos naquela altura ao lado dos Vieiras, e logo ao lado deles moravam o Sr. Gomes que viria a ter a escola de condução mais tarde ; a filha dele, a Emília Gomes que já  vi nas fotografias do encontro dos Tetenses que houve em Viseu, também tirou o brevet mais tarde. Por detrás s dos Vieiras morava o João de Oliveira, que "tratava por tu" o reboque do batelão, isto muito antes de haver a ponte, claro.
Quando fui almoçar, era sempre por volta do meio-dia, a minha mãe estava cada vez mais preocupada, por não ter, como tinha ficado o combinado, noticias dele ; naquele dia não dormiu sequer a sesta, como todos tinham o Hábito, excepto eu que nunca pude, porque acordava com umas fantásticas dores de cabeça. (parava a digestão).
A meio da tarde, quando voltei a casa pr’a ir lanchar, a minha mãe tinha olhos de quem tinha chorado, mas eu não sabia porquê.
Quando estava a lanchar, provavelmente pão fresco da padaria do Serra, com leite condensado, (adorava aquilo) ouvi a minha mãe na sala a falar ao telefone, e parecia estar a falar do meu pai.
O Sr. Neves que morava mesmo por trás de nos, na outra rua, onde viríamos a morar mais tarde, e que era um grande nosso amigo, tinham tirado o brevet juntos ele e o meu pai, apareceu "esbaforido" a querer saber mais pormenores.
Ao cair da noite, o Governador em pessoa, (o meu pai era o Responsável do Departamento das Comunicações Secretas do Governo do Distrito) telefonou à minha mãe, para lhe dizer que o meu pai tinha tido um acidente com o Auster, no Revuwé, mas não tinha mais pormenores, porque a "propagação" estava muito má  naquele dia ; eis o que tinha acontecido :
Enquanto o meu pai almoçava com o administrador do Revuwé, um militar do acampamento que havia ali perto, despejou uma cisterna d’agua mesmo no meio da picada onde o meu pai tinha aterrado com o Auster.
Quando mais tarde se despediu do administrador e da esposa, ao rolar umas dezenas de metros, a roda de cauda do Auster que era um avião feito em tela, levantou, o aparelho passou diante do sitio onde estava o administrador, a esposa e vários cipaios da OPV, e quando passa em cima daquele "matope" provocado pela agua da cisterna, o Auster começou a perder velocidade, ele pôs-lhe o motor "aos copos" para compensar aquela perda de velocidade e o aparelho acabou por se decidir a sair do chão, mas ao olhar pró nariz do avião, vê que não tem altitude que chegue pr’a evitar os eucaliptos que havia no fim da picada, e é nesse momento que leva o manche à perna esquerda, pr’a tentar passar de lado entre as fiadas dos eucaliptos, mas como tinha que acontecer, a asa esquerda tocou nos ramos mais altos, e o avião, completamente descompensado, capotou várias vezes até cair de rodas pró ar, em cima duma vala de evacuação das retretes, aberta pela tropa.
Estava todo dorido dos diversos impactos que tinha acabado de levar, e a única coisa que lhe passou pela cabeça, foi sair dali pr’a fora o mais depressa possível. Quando destravou os cintos de segurança, é que se apercebeu que estava de cabeça pr’a baixo e caiu na lama dentro da vala.
As 4:30 da manha ouvimos o barulho dum Berliet da tropa, parar em frente a  casa e quando a minha mãe acendeu as luzes de fora, vimos vir o meu pai acompanhado por um militar ; não tinha um sapato nem as asas, a camisa e as calças todas rasgadas e ensanguentadas e a sorrir !
Uns meses mais tarde tivemos a ocasião de ver os destroços do avião, no aeródromo de Tete, e no cockpit do qual ele tinha saído praticamente intacto, não cabia lá, nem uma criança de 10 anos.
      

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