Que meus filhos e netas recordem o meu amor pela escrita! Afinal as histórias são feitas para serem partilhadas. Só assim elas se propagam e se perpetuam...

domingo, 30 de dezembro de 2012

O Réveillon.







Mil novecentos e sessenta e tal, na idade da vaidade, onde tudo que nos rodeava era pouco para encher o nosso ego.
Era bonita, morena e uma alegria que me acompanha pela vida fora.
Véspera da noite de final do ano, como hoje que escrevo estas palavras, talvez por isto recordo de olhar perdido no passado e sorriso nos lábios, esses tempos que a distância e as rugas que já se instalam em meu rosto, não me deixam esquecer.
Tempos felizes, uma juventude invejável, onde o futuro não incomodava porque o presente nos enchia a alma.
O vestido de baile prestes a ser entregue fora confeccionado pela Lurdes Ramalho, a modista mais in da cidade.
O modelo desenhado primorosamente por mim, uma cópia alterada a meu gosto de uma figura retirada duma revista de moda, comprada na papelaria Lopes.
A condição era que a modista nunca desvendasse como seria o vestido dessa noite a ninguém, o que fazia com que ela acabasse por deixar para a noitinha os trabalhos mais sigiloso não fosse alguém aparecer de surpresa.
Era rosa o chiffon, tecido leve e elegante, a frente todo bordado de perolas e lantejoulas, cingido ao corpo duma elegância e beleza, de fazer inveja.
A ideia era mesmo essa, chegar ao Baile e Tchanam! ser a surpresa que faria os rapazolas ficarem de queixo caído e as moçoilas roídas de inveja.
A marcação da cabeleireira era outra maratona da época.
Na altura na cidade que nem era tão grande assim, já havia 4 ou 5 cabeleireiras, mesmo assim abarrotavam nesses dias e era ver toda a gente esperar horas a fio pelo penteado desejado.
A mesa no aeroclube, há tempos que já estava reservada, o baile mais in da época.
Era a noite mais importante do ano, nada poderia falhar.
Aperaltavam-nos cuidadosamente, sapatos dourados a dar com a toilete, maquilhagem á época, um eyeliner finíssimo á moda de Cleópatra, que realçavam os olhos primorosamente pintados. Nos lábios um batom rosa que nunca deixávamos que desaparecesse.
Por fim antes de sair de casa o perfume por detrás das orelhas, nos pulsos e nas mãos, (isto já com segunda intenção, a de deixar a marca da nossa presença nas mãos do par com quem dançássemos).
A chegada ao aeroclube, o nosso coração quase nos saia pela boca, até que estacionasse o carro, a expectativa era imensa.
E lá fazíamos a nossa entrada triunfal, apesar de na pista já rodopiarem alguns pares ao som do conjunto “Os 5 de Cabora Bassa”, nada nos tirava o protagonismo.


E durante toda a noite era a festa, as estrelas do céu brilhavam e a temperatura quente convidavam a bailarmos até o raiar do novo ano.
 Para trás ficavam as rugas do vestido novo amachucado, o cheirinho do aftershave daquele rosto que rocara o nosso, no corpo um calorzinho bom de dançar agarradinha, um sonho que nos adormecia até ao despertar do novo dia.

Tempos felizes.

Feliz 2013