Tinha
apenas 8 aninhos quando deixei a escola primária do Moatize porque meus pais
foram residir para Tete.
Lembro
como se fosse hoje, da escolinha e da professora senhora de idade de nome
D.Dativa que me ensinou as primeiras letras numa escola de crianças
multirraciais que tão bem brincávamos nos recreio.
Pois
com pena deixei para trás os coleguinhas e a velha malambeira que fazia sombra às
brincadeiras nos intervalos.
Com a
mudança ingressei no colégio de freiras da cidade, Colégio de S.Jose de Cluny.
Outro
tipo de ensino, outro ambiente e tudo o mais diferente da escola anterior, e
como professora uma freira anafada de vestes tais que apenas se via a cara e as
mãos, que me deixou apreensiva. Irmã Florência.
Não
foram fáceis os primeiros dias numa escola onde não havia por ali a circular só
meninos da minha classe mas tantos meninos mais crescidos de todas as classes.
Tudo
foi correndo uns dias bem outros assustada pois entre nós havia uma garota mais
crescida que todos de nome Leonor que era sempre chamada para nos dar réguadas
com a menina-de-cinco-olhos, quando não aprendíamos ou dávamos erros no ditado.
Raras
eram as vezes que não ia para casa chorar, não porque tivesse levado réguadas
mas assustada com tamanha disciplina.
A
sala de aulas era no rés-do-chão do colégio ao lado esquerdo de quem entra, no
mesmo corrido da sala de música e do gabinete da madre superiora.
Bastas
vezes me perdia divagando ao som do piano senão quando ouvia a cana a bater na
minha carteira, que fazia o tinteiro branco redondo de tinta saltar.
E
foram passando os anos e aquele colégio tornou-se a minha segunda casa, anos
após ano foi ali que estudei e aprendi o muito que hoje sei.
Com o
tempo as amizades foram-se criando e os medos foram-se perdendo.
Essa
liberdade irreverente que muitas vezes deram aso a castigos que cumpríamos à risca mais que não fosse para rapidamente voltarem ao grupinho por sinal não
muito bem comportado.
Mas
era entre risos de alegria que fazíamos as nossas patifarias.
No
primeiro ano que chumbei, de castigo meu pai pôs-me em Vila Pery a estudar como
interna, tempo que já relatei tempos atrás.
Mas
de nada valeu, apenas uma grande tristeza que se apoderou de mim e de meu pai
com esta separação e depressa voltei a Tete ao meu colégio a minha segunda
casa.
Regressei no ano seguinte, era ali o meu lugar, onde encontrei os
professores que me dobraram na minha indisciplina.
Não falando da Irmã Maria
que segurava todo o colégio a pulso forte, e um ou outro professor a
brincadeira continuava.
Relembro
um professor de francês que dava a aula independente do barulho que fazíamos até
que um dia desafiamos a sorte jogando à bola durante a aula.
A
sala de aula era virada para a frente do colégio junto a varanda da sala dos
professores
.
Dr.
Patrício mandou-me “fechar a porta por fora” o que queria dizer que ia para a
rua. Obediente levantei-me e fechei a porta pela frente, dei a volta pela sala
dos professores aquela hora vazia e entrei novamente na aula pela porta lateral
que dava para a dita varanda da frente.
O
grupinho aliado nas minhas brincadeiras desatou aos risos enquanto
sorrateiramente me sentava no meu lugar novamente.
O
professor mandou-os calar e nem deu pelo meu retorno à sala de aula.
Fui
sempre externa mas numa altura que meus pais se ausentaram da cidade fiquei uma
semana ao cuidado do colégio ou seja como interna, e realmente também foi outra
aventura.
Após
o dormitório estar em silêncio mais uma vez o grupinho de bem comportadas
resolveram fazer um pick nic, e carregadas de bolachas e doçarias rastejamos
por debaixo da cama e juntamo-nos tentando fazer pouco barulho o que não
resultou pois a irmã que tomava conta apareceu de lanterna na mão focando todas
as camas a ver o que se passava.
Minutos
antes de aparecer todas se enfiaram nas camas mais perto, outras ficaram duas
na mesma cama e outras ficaram mesmo debaixo da cama, no maior silêncio, não
vendo alteração alguma a irmã retirou-se e la continuamos a paródia.
Enfim
muitas cenas destas se passaram naqueles anos, mesmo assim fui boa aluna.
Deixei
amizades e parti para a vida ali me separei de todas por imperativo da guerra
colonial que nos levou cada uma para seu lado.
Anos depois quando casei naquela igreja mesmo ao lado do colegio onde toda a vida estudei não poderia faltar a foto de familia e nela todas que me acompanharam vida fora.
Ainda hoje Irmã Trindade à epóca bem jovem recordamos o dia em que ela sentada ao orgão da igreja tocou pela primeira vez numa cerimonia de casamento, a minha.
É um orgulho este meu passado.
Voltei um dia a Tete e nas mesmas escadas que tantas recordações tenho fiz questão de tirar uma foto com as alunas actuais.
Meio século
depois quando a vida nos separou e criamos novas responsabilidades, viramos mãe
de filhos e avó de netos eis que anualmente nos juntamos.
É o
nosso dia e vamos passando palavra e cada ano mais e mais colegas aparecem e
por horas voltamos á irreverencia dos tempos de juventude, falamos e rimo-nos
sem controlo porque acima de tudo aquelas são a família de muitos anos de
estudantes.
E eis
que aparecem fotos nas páginas de cada uma com um ar de felicidade e
cumplicidade que o tempo jamais apagará.
Em
todos estes anos apenas faltei a 2 encontros e este último com muita pena
deixei de ver colegas que o destino ainda não nos havia juntado.
Que Deus permita que nos juntemos todas por muitos anos.
Até sempre amigas!
(Nota: Algumas fotos do colegio aqui colocadas são partilha de amigos da internet)
1 comentário:
Activando a memória, com boas recordações!
Gostei de ler!
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