Foto da internet. Luisa Hingá
Foi
há muito tempo, o telefone não parava, e a costureira que ainda não
me tinha o vestido para o baile de fim de ano pronto. E o lugar da
cabeleireira marcada a hora há já uma semana, estava em cima dela.
A
Cabeleireira D. Maria José Simas morava na mesma rua da costureira
D. Lurdes Ramalho, saio a correr à boleia do meu pai e peço para
parar por minutos em frente a casa dela.
Subo
as escadas duas a duas quase deitando os bofes pela boca, ao que ela
logo que me vê diz estar um bocadinho atrasado.
O
vestido era cor de rosa em chiffon, sem ombros mas preso a volta do
pescoço simplesmente, mas a frente toda ela era bordada a mão com
pedraria e missanga.
Olhei
para ele entre mãos que seguravam a agulha rápida no enfiar das
pedrinhas e borda-lo.
Achei
lindíssimo, só pedi que o tivesse pronto quando voltasse da
cabeleireira.
Impaciente
já ouvia a buzina do Volvo que meu pai tinha, pela demora que
ocorria.
Desço
as escadas a correr com a possibilidade de me espalhar e já não
poder ir ao baile.
Enquanto
me leva a arranjar o cabelo, vou perguntando se havia reservado mesa
para o réveillon.
Entro
no salão e estava cheio, todas as senhoras se haviam lembrado de
arranjar o cabelo tarde, desanimei ao mesmo tempo que ia pensando que
poderia fazer dele pois era comprido roçando o meio das costas e eu
não tinha mãos para fazer nada dele.
Já
sol baixava quando chega a minha vez, mais um pouco e sairia de lá
com um artístico penteado de fazer inveja a qualquer uma (isto nas
miúdas era corrente).
Depois
de pronta saio apressada apanhar o meu vestido, lindo de morrer, e
levo-o para casa.
Quase
não jantei, entrei vezes sem conta no meu quarto onde estendido
cuidadosamente brilhava a minha joia da coroa.
Caramba
não mais chegava a hora de sairmos de casa.
Peguei
no pó de arroz, no blush nas sombras etc e comecei por ai, com todo
o cuidado ia fazendo a maquilhagem, que tinha medo borratar com o
calor que fazia.
Lá
fora estendido ao fresco numa cadeira de lona meu pai parecia nada
ter a ver com nada.
Chamei-o,
disse-me que ainda era cedo. Não, jamais vestiria o meu vestido com
a antecedência de sair de casa não fosse ele amarrotar-se.
E
o relógio que resolvera também andar mais devagar, nunca mais eram
as tais horas de sairmos.
Até
que senti que ele se levantara calmamente para também se aperaltar,
afinal havia um ano a sair do calendário e outro a entrar.
Saímos
de casa, todos arranjados e perfumados, em direcção ao aero-clube.
Sinceramente
quase me não sentei no carro, fazia força com os braços no assento
da frente para não me sentar e não amarrotar o vestido.
Ufa!
Como era longe de minha casa, além de que ao chegar o estacionamento
de carros estava cheio, o que mais demorou, encontrar lugar para
estacionar.
Quando
por fim subi as escadarias principais, de vestido que brilhava como a
lua, saltos altos e brincos compridos terminarem numa pérola, pensei
estar num céu só meu.
Já
a musica do conjunto tocava e a sala cheia de dançarinos, desiludiu-me pois pensei haver mais olhares para a minha beleza.
E
dancei, dancei a noite toda deixando de me importar até com a
transpiração que ia marcando o vestido.
Meia
noite e o adeus ao ano velho com a chegada do ano novo era uma
euforia sem igual.
Taça
de champanhe na mão de braço levantado, e corria-se as mesas
brindando com todos.
A
música continuava, já o sol queria romper as trevas para dar lugar
ao novo dia quando aos poucos iam saindo, ficando apenas aqueles que
abraçados olhavam a bola vermelha que indicava o novo dia vir a ser
bastante quente.
Era
assim um dos fins de ano na terra onde nasci, e que me deixam muitas
saudades.