Fui
à aldeia, é bom ir passear à aldeia onde a historia dos nossos
antepassados paira no ar, e em cada pedra da aldeia que os viu
nascer.
Olhar
os campos onde outrora brotava da terra os milhos, o centeio e as
hortaliças, o gado pastava e os pinhais “choravam” a resina
para pequenas bicas de barro que se transformariam em economias de
muita gente, e a vida existia .
Eram
aldeias simples de casas de pedra ruas sem alcatrão onde se ouviam
os gritos das mulheres chamando alguém que bulia nos campos, as
crianças que brincavam no largo e o chiar das rodas das carroças
carregadas de fenos ou qualquer outro produto do campo.
Via-se
gente movimentando-se os mais idosos sentados à soleira da porta
fazendo meia ou remendando alguma roupa.
Hoje
os campos estão de “poiso” não há braços que os trabalhem, a
gente nova partiu para a “estranja” os mais velhos para o céu.
Mas
acho que todos ainda tem um primo ou familiar de porta aberta que nos
receba, e é sempre uma alegria.
Perde-se
a conta às horas que passam a recordar tempos antigos historias
maravilhosas vivências de outros tempos que o tempo jamais apagará.
Minha
mãe com um sobrinho relembrando passagens da vida, hábitos de
outrora entre um esgar de saudade e um riso, inclusive os palavrões
que os velhos já podres de cansaço largavam num grito de revolta
mas que os fazia sentir bem aquela descarga de adrenalina e cansaço.
Era
uma vida de muito trabalho e pouco descanso. Diariamente por volta
das cinco da manha já os regatos de agua corriam para regar os
milhos, fosse verão ou inverno era por essa hora que se começava o
dia, e terminava quando já o sol se pusera há longas horas.
Uma
imensidão de trabalhos que teria que ser feitos diariamente para
sustento da família raramente com menos de cinco ou seis filhos.
No
rolar da conversa da qual eu nem fazia parte, pois fluía baseada
numa época que eu nem existia mas com muito gosto ia ouvindo.
Eis
que oiço o relatar de uma passagem de uma das minhas bisavós que
achei de inicio caricata mas com um fim maravilhoso.
D.
Amélia senhora abastada no tempo vivia numa casa de pedra com um
largo onde recolhiam as lavouras bem como o produto delas,
acompanhada de uma criada.
Tinha
cinco filhos que já haviam ido às “sortes”* alguns já mesmo
casados quando quis o destino que ficasse viúva.
Decidiu
então fazer as partilhas dos bens em vida pelo que sozinha rabiscou
num papel todas as terras que possuía e dentro daquela que era a sua
justiça repartiu por todos os filhos igualmente, deixando uma única
que tinha junto à casa.
A
condição básica é que todos aceitassem e não poderia haver
trocas, pois ela lá tinha as suas razões.
Das
terras repartidas por cada um dos filhos, enquanto fosse viva teriam
que anualmente
entregarem-lhe
determinada medida de milho, centeio, azeite, batatas, lenha para o
inverno, etc que lhe daria para todo o ano.
Do
terreno junto a casa , seriam cultivados pelos filhos todos os mimos
da casa tais como hortaliças, feijão verde, alface, tomate que
apanharia a seu belo prazer quando precisasse todo o resto seria para
beneficio de todos.
Ao
chegar a este momento da historia confesso que um diabinho me soprou
ao ouvido, para que raio queria a velha senhora estas mordomias pois
era só mais a criada sobraria certamente o que iria receber.
Continuei
a ouvir o relato da historia que desconhecia de todo.
Ao
domingo a mesa era posta em casa de D.Amélia e ao almoço todos os
filhos lhe faziam companhia , e a conversa fluía entre todos falando
sobre a vida as culturas e a família.
Entendi
depois a ideia da idosa, assim conseguia manter a união familiar e
quanto a partilhas jamais haveria confusão.
No
entanto fiquei a magicar sobre o excedente que certamente teria ao
receber anualmente o determinado de cada filho.
Eis
que para surpresa minha, oiço dizer que tendo sido questionada ela
responde que o excedente seria distribuído aos mais necessitados que
muitas vezes lhe passam a porta sem uma côdea de pão para comerem e
dar aos filhos.
Orgulhei-me
desta minha bisavó que soube manter a família unida, e aos mesmo
tempo fazer caridade que naquele tempo era bem necessária.
*sortes- serviço militar