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Uma das lembranças boas que
tenho de Tete era um velhinho de bengala na mão, acompanhado de seu cão que
passava diariamente á minha porta.
De seu nome João Mendes,
descia a rua caminhando vagarosamente de sorriso aberto despontando por debaixo
do bigode bem aparado, e barba feita, cumprimentava todos que com ele se
cruzassem.
Nós garotas, achando graça
lá estávamos junto a vedação do quintal à espera que ele passasse para lhe
dizermos bom dia e afagarmos por momentos o canito seu amigo inseparável.
Tinha como companheira uma
senhora negra que se incumbia de o trazer bem arranjado, limpo alimentado o que
fazia dele um homem feliz.
Á tarde após o almoço,
estendia-se na cadeira de lona na varanda colonial, onde uma brisa fresca se
cruzava refrescando-o enquanto dormitava a sesta até o calor passar.
Perto numa mesa de madeira
pequena, estava a moringa tapada com um copo de borco coberta por um pano
bordado com flores garridas a ponto pé de flor, e ladeado de um piqué de
crochet rosa.
A função era cobrir das
moscas e deixa-la protegida do calor.
De quanto em vez João Mendes
matava a sede naquela frescura de água e recostava-se novamente deixando que o tempo
passasse calmamente.
E os dias iam passando,
acarinhado e sempre assistido por uma alma caridosa que o acompanhou até que partiu.
Morreu feliz.
Meio seculo depois, noutro
país, vejo da minha janela um outro
idoso, que passa diariamente a minha porta, andrajoso só arrastando os pés
cansados, ar carrancudo que nem cumprimenta.
Vive só numa casa de pedra
onde a luz e o frio atravessa por entre frinchas que já nada os impede.
A um canto uma lareira com
brasas quase apagadas, que o aquece nos dias frios.
Uma enxerga com cobertores
velhos onde se enrola na noite, e passa frio.
Come do que lhe dão as
vizinhas ou apanha no lixo.
Tem uma pequena reforma que
mal chega para a farmácia, mas vai dando para comprar pão e pouco mais.
A tarde senta-se numa pedra ao sol, com um olhar perdido talvez pensando nos filhos emigrados.
Ninguém se lembra que
existe, e assim vai andando esperando que a morte o leve, fechado em recordações de uma vida dificil e uma velhice igual.
Que mundo este!