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A poucos quilómetros de D. Emília,
quase na fronteira com o Malawi outro casal tinha a sua cantina.
Ferreira, casado com Ana mulher
baixinha e rechonchuda para ali foram há longos anos.
Inicialmente tiveram uma cantina
bem mais perto do Zobué, ali nasceram os dois filhos, António e Mariana,
criados entre os mufanas da terra até a idade escolar.
Uma casa pequena e uma loja igual
davam o sustento da família.
Não tinha água canalizada, nem
luz. Diariamente um trabalhador transportava água carregando duas latas
penduradas num pau que assentava nas costas.
A luz era de candeeiro a petróleo
e velas. Por isto se deitavam cedo e madrugavam.
Ferreira tinha um camião que
fazia transporte do milho para o destino da venda efectuada e Ana, tomava conta
da loja e das crianças.
Como todas as cantinas, esta também
era isolada, de manha á noite apenas conviviam por as gentes das aldeias indígenas
em redor.
Ali se dirigiam diariamente com
as crianças a reboque, umas pela mão, outras nas costas acomodadas pela
capulana surrada que já servia desde a última colheita do milho.
Compravam essencialmente óleo, sal e açúcar, de vez em quando, e já quando as crianças começavam andar, umas
cabedulas para o menino ou um vestido para a menina. Era o alfaiate que sentado
a porta da loja, as cozia.
Na falta de dinheiro iam fazendo
a troca, basicamente do milho.
Apos a colheita levavam á cabeça em sacos de
serapilheira e vendiam ao cantineiro que nessa altura num extremo da varanda exterior
da loja ali fazia o negócio.
A medida era uma lata de gasolina
de 20litros, em troca de determinada quantia ajustada.
O milho era deitado na lata, abanado
e batido, depois rasado por baixo, para render no preço.
De nada valia o "refilanço"
dos negros, afinal por ali não havia concorrência.
De notas na mão, logo ali deixava
boa parte, pois encostavam-se ao balcão e emborcavam uns copos dum vinho mais
que rebaptizado acabando por dali sair muitas vezes cambaleando.
Nessa altura faziam as compras do
ano, cabedulas novas e camisa para ele, talvez desse para a mulher comprar a
capulana nova, ou um fio de missanga que depois sentada á sombra da mangueira
ia enfiando as contas até fazer o “chibante” que tanto gostavam.
E assim ia passando os dias, até
que chegou a altura de António e Mariana irem a escola.
Como ainda era distante, fizeram
uma carrocinha com duas rodas puxada pelo negro mais forte do sítio e pela manhã
levava os meninos á escola.
Ficava a espera que esta
terminasse até regressarem novamente do mesmo modo a casa.
Diariamente assim fizeram, até
que chegou a altura de terem que ir estudar para a cidade.
Os pais de Ana viviam em Lourenço
Marques e foi para lá que foram os meninos.
A solidão caiu em casa, faltavam
os gritos das crianças e a saudade ia apertando, contavam diariamente os dias
que faltavam para as férias.
O velho radio a pilhas, ia fazendo a sua função, informando-os e distraindo-os com as musicas que passavam, unica coisa que os ligava ao mundo.
O tempo foi passando, e decidiram
comprar uma outra cantina mais perto da fronteira com o Malawi onde o negócio
seria mas prospero.
Assim fizeram e mudaram-se para
lá deixando naquela um rapaz que haviam mandado vir de Portugal.
A nova cantina era maior a casa
mais acolhedora com a perspectiva do negócio com o lado de lá.
Apesar de correr bem a vida, a solidão
era maior, pela manha apenas os macacos se ouviam até que com o andar das gentes
estes recolhiam á montanha.
Raramente os amigos os visitavam,
mas quando acontecia era uma festa.
Matavam o melhor galo da
capoeira, fazia biscoito no forno a lenha, a assavam os enchidos que fizera
quando da matança do porco, o que não deixara de fazer porque ajudava no
sustento da casa.
A geleira a petroleo la estava para isso.
E conversavam até altas horas, jogavam as cartas até o sono não deixar, e deitavam-se felizes.
A visita e tudo que se falara dava para conversa de meses após ficarem novamente sós.