Hoje é domingo,
estou a trabalhar mas lembrei uma missa especial que muitas vezes assisti e de
tanto gostar do padre que a rezava foi o que me casou e baptizou meu filho.
Homem baixinho,
barba grande, irrequieto com um coração do tamanho do mundo, sempre pronto
ajudar os mais necessitados, e poderei dizer que por isto era pobre.
Nasceu em Madrid, o dia
2 de Fevereiro de 1934. Estudou no Seminário de Madrid e no Seminário Nacional
de Missões de Burgos (IEME). Foi sacerdote diocesano e missionário do clero
secular espanhol.
Tete foi a cidade que o
acolheu quando após ser ordenado padre em 1958 foi para as missões.
E foi ai por onde ele
sempre andou, no meio do povo africano independentemente de sua cor ou credo os ajudava e protegia.
Quem não conhecia em
Tete o Padre Castro?
Tinha uma motorizada já muito
velha que alguém lhe havia dado, mas de velha e cansada era mais as vezes que
estava avariada que a andar, mas era nela que percorria as aldeias e aldeamentos
pelo mato numa constante ajuda a quem precisava.
Os pneus de tanto andar
por caminhos e carreiros de pedra já só andava nas lonas e as avarias eram constante,
Quando acontecia era nas
oficinas de meu pai que a deixava sem precisar de nada dizer, apenas comentava
de riso no rosto que já nem à “guiinha” (empurrando) fazia nada dela.
Habituados que estava o
pessoal a estas queixas de imediato a iam arranjar, remendando aqui e ali mas
que ficasse andar pois eram as pernas de quem precisava ajuda deste homem
dedicado á missão para que fora destinado.
Não raras vezes batia á
nossa porta, já sabíamos vinha matar a fome, entrava e comia connosco como um familiar
e grande amigo. Dali saia sempre com um saco cheio de comida que prendia na
grade sobre a roda traseira da mota e lá ia feliz.
Uma manhã apareceu com um
missal, autografado por ele com uma dedicatória maravilhosa e deixou-o nas mãos
de meu pai.
Ainda hoje é por ele que
rezam as orações da manhã e à noite, e assim ele passou a estar connosco ao
longo de todos estes anos.
Dizia ele nos tempos conturbados
da guerra,
"Temos muito que trabalhar e ajudar a levantar este país que tanto custou independizalo.
Estou muito feliz e faltando muitas mãos"(sic)
E estava, e continuou a sua missão de ajuda e apoio as
populações vítimas da guerra acolhendo-os e escondendo muitas vezes dentro da
sua missão homem, mulheres e crianças perseguidos.
No meio de toda esta azáfama a 6 de Agosto de 1976 quando tinha
42 anos, viajava para a Beira com vontade de passar uns dias de descanso . Ia
na companhia de outro sacerdote uma freira e um miúdo que ia a seu lado na parte
traseira do carro, eis senão quando caem numa emboscada na ponte do rio Pungué
perto da fronteira com a Rhodesia, e foram assassinados pelas tropas Rodesianas
numa incursão a Moçambique, momento no que ambos países estavam em conflito:
Nesse dia mais 340 moçambicanos tiveram a mesma sorte
assassinados pelas mesmas tropas.
Um mês antes havia escrito
a sua mãe :
ÚLTIMA CARTA (Julho de
1976)
Querida mamã:
Recebi a tua carta que
escreviste a primeiros de Julho. Vejo que as minhas cartas chegam muito
atrasadas. Mas chegan. Já estaba ansioso por receber a tua. A tua carta é toda optimismo e me das todas
as bênções havidas e por haver. Obrigado. Es uma mãe muito gira e valente que
eu tenho visto. Ninguém te ganha em generosidade e por isso o Senhor te da
sempre um cento por um. Bendito sejá Deus mil vezes. Assim sejá.
Mamã: sou simplesmente
feliz com todo isto e me encontro como peixe no rio. Sigo com muitas ganas de
ser padre e sigo sem ter tempo para casar-me. Só peço a Deus um sobrinho que se
chame Luis Garcia, que ainda não há. Olha que pouco ambicioso som para as
coisas do mundo!
Esmas que no céu falemos
a vontade porque, como vês, neste mundo vivemos com presas e não há tempo para
as nossas coisas. Deixá. Da bem mais felicidade dar que receber. Porque quem
da, da e recebe alegria. E, que mais queremos mamã?, essa é a vida. O egoísmo é
a morte, é dizer, o pecado. Por aí não nos vão colher. Quando morramos diremos:
MISSÃO CUMPRIDA. Que é o que tu fizeste? Pois, nada especial. Alegrar todo o
que eu puder aos demais, dando guloseimas para o corpo e para a alma. Passou a
vida assim correndo...Passa. Deus dirá. Assim Seja.
Que mágoa que não tenhas ainda setenta anos!
Vir-te-ás comigo. Ai, as minhas velhotas se te vier! Morrer-te-ás de gosto.
Podes vir apenas uma temporada. Por que não? Saca passaporte. E regressamos
juntos. Um bilhete de ida e volta por quarenta e cinco dias e pronto. Em quinze
horas apresentamo-nos em Moçambique. Animo! Vai aforrando. Isso não vai ser
problema. Venderemos maçãs carameladas na porta do metro. Não te faltaria nada.
Temos médicos e enfermeiras -monjas-. E comidinhas apropriadas. °Já, já...! Ta
bom. Ao serio. Não é nada impossível, Ai, que surpresa era!
És tremenda. A tua carta
tranquilizou-me muito. És a mulher forte da Bíblia. Já não estou coxo, já não
tenho parasitas e já não tenho nada nas mãos nem nas plantas dos pés. Milagre.
Obrigado com Deus. E peso 75 quilos.
Estou giro e elegante. Saudações a todos e abraços. Quero-te. LUIS.
(padrecastro.wix.com/padrecastroport#!viajeport/c1n86)
Partiu o padre
que deixou muitas saudades a todos.
Que descanse
em paz, entre nós Tetenses de todas as raças será sempre recordado.